no icon

JOSE ROBERTO TEIXEIRA PEREIRA

BRASIL E CHINA: 50 ANOS DE CONVERÊNCIA PRAGMÁTICA, ESTABILIDADE E PROGRESSO

Compartilhe esse conteúdo

BRASIL E CHINA: 50 ANOS DE CONVERÊNCIA PRAGMÁTICA, ESTABILIDADE E PROGRESSO

UNIVERSIDADE LA SALLE

BRASIL E CHINA 50 ANOS DE CONVERÊNCIA PRAGMÁTICA, ESTABILIDADE E PROGRESSO

José Roberto Teixeira Pereira Acadêmico do Curso de Relações Internacionais da Faculdade La Salle Manaus E-mail: 20893172@faculdadelasalle.edu.br

Karolynne Moura de Souza Acadêmica do Curso de Relações Internacionais da Faculdade La Salle Manaus E-mail: 20893195@faculdadelasalle.edu.br

Professor de Relações Internacionais pela Faculdade La Salle Manaus: Prof. Dr. Jonathan Félix Ribeiro Lopes

Resumo

Em 2024 Brasil e China celebram 50 anos de laços diplomáticos que inicialmente mudou a forma da atuação da política externa brasileira. Este artigo tem como objetivo analisar as principais mudanças na política externa brasileira com relação a China. As ações tomadas pelos dois países obtiveram um alto crescimento econômico, diplomático, científico e tecnológico e comercial. Assim, o argumento desse estudo consiste: Quais são os desafios para a manutenção da estabilidade e convergência pragmática nas relações bilaterais sino-brasileira? Diante desta, esse artigo se baseia de uma análise fundamentada sobre análise de política externa brasileira. Para isso, a pesquisa se baseia em uma revisão de literatura, documental e de sites oficiais das iniciativas das cooperativas e das organizações brasileiras envolvidas nas interações bilaterais.

Palavras-chave: Política Externa brasileira, Relações bilaterais, China

Abstract

In 2024, Brazil and China will celebrate 50 years of diplomatic ties that initially changed the way Brazilian foreign policy operates. The aim of this article is to analyze the main changes in Brazilian foreign policy towards China. The actions taken by the two countries have achieved high economic, diplomatic, scientific, technological and commercial growth. Thus, the argument of this study is: What are the challenges to maintaining stability and pragmatic convergence in Sino-Brazilian bilateral relations? With this in mind, this article is based on an analysis of Brazilian foreign policy. To this end, the research is based on a review of the literature, documents and official websites of the cooperative initiatives and Brazilian organizations involved in bilateral interactions.

Keywords: Brazilian Foreign Policy, Bilateral relations, China

INTRODUÇÃO

As relações bilaterais entre Brasil e China em 15 de agosto de 2024 completaram 50 anos, desde que, o Governo de Ernesto Geisel, foi autorizada a construção da embaixada chinesa em Brasília e da embaixada brasileira em Pequim. As relações diplomáticas entre os dois países com a 4ª visita de Estado pelo Presidente Lula à China em 2023, onde firmou 15 acordos bilaterais em áreas como Ciência e Tecnologia, Indústria e Comércio e Finanças e a construção do Satélite Sino-Brasileiro de Recursos Terrestres (CBERS-6) prevista para 2028. Dessa forma, as relações com a China tornaram-se um dos eixos centrais na política externa brasileira.

Com a ascensão da China na política e no comércio internacional impactada pelo rápido crescimento econômico, somada as políticas públicas eficazes e o anseio do Brasil de consolidar sua posição de protagonismo na arena internacional, urge a necessidade de examinar e alinhar as agendas de forma equilibrada. Dessa forma, a adaptação da diplomacia brasileira à presença crescente da República Popular da China no cenário internacional é, portanto, elemento crucial para a análise.

Como justificativa para essa pesquisa é importante destacar o impacto que as relações Brasil-China apresentam no sistema internacional, especialmente no que se refere à economia, ciência e tecnologia e a política internacional. Em 2009, a China passou a ser o maior parceiro comercial do Brasil, ultrapassando os Estados Unidos que estava liderando o ranking por cerca de 80 anos e a Argentina, respectivamente (Brasil, 2023). 

Este artigo encontra-se dividido em quatro seções, além desta introdução e das considerações finais. Primeiramente, faz-se necessário realizar uma revisão de literatura sobre a análise de política externa. Em um segundo momento, será apresentado a relevância das relações bilaterais nas relações internacionais, a terceira seção apresenta um panorama com aspectos históricos da relação entre Brasil e China desde as construções das embaixadas até a formalização da parceria estratégica. Nessa seção serão analisados documentos oficiais, memorandos de entendimento, visitas e acordos de cooperação entre os dois países.

Por fim, na quarta e última seção, serão abordadas as duas últimas décadas de interação entre Brasil e China, período no qual as relações se consolidaram. Nessa fase, houve uma intensificação dos laços comerciais principalmente com o evento da mundialização e que se expandiu para áreas de ciência e tecnologia, infraestrutura e programa de satélites. Ademais, essa análise vai identificar os entraves enfrentados pela diplomacia brasileira nos últimos tempos para dessa maneira, atuar com uma China cada vez mais influente no cenário internacional.

DESENVOLVIMENTO

DEFINIÇÃO E CONSTITUIÇÃO DA ANÁLISE DE POLÍTICA EXTERNA

Segundo Milani (2015), a Política Externa é um conjunto de ações e decisões de um ator, estatal ou não, em busca de alcançar objetivos e interesses a nivel internacional. Do ponto de vista dos Estados, é a forma de demonstração de poder e do uso de recursos disponíveis a fim de atender demandas internas que variam de acordo com as necessidades de cada país. A análise de Política Externa feita da relação Brasil- China confere características próprias e particulares, Do lado brasileiro, seu início retrata um Brasil que buscava se desvincular da grande influência norte-americana somada à busca por expansão e diversificação econômica. 

A princípio, pensava-se que o comportamento dos Estados era definido pela sua posição no sistema internacional e suas atitudes e ações eram resultado de um cálculo racional feito internamente por cada um, essa visão realista/sistemática coloca os Estados como os principais atores do sistema internacional, e principalmente como um ator unitário (Gonçalves; Pinheiro, 2020). Atualmente, outros elementos são levados em consideração quando pensamos na análise de política externa. O elemento doméstico ganhou destaque sendo parte determinante da política externa. Segundo Jr (2009), a Política Externa de um país deve ser vista como política pública pois sua formação e elaboração acontece internamente, de modo que a diferença da política externa para a política doméstica se dá apenas no campo de implementação. Portanto, a Análise de Política Externa tomou para si vários outros níveis de análise, reconheceu novos atores e se consolidou investigando os processos decisórios que antecederam a aplicação da política externa.

Com uma forma de análise antagônica as ideias Realistas, os Liberais contribuíram com um novo modo de ver as relações entre as nações, principalmente autores como Keohane (2005), que escreveu sobre a importância das instituições internacionais, da cooperação e do fortalecimento das democracias, pois esses fatores seriam determinantes para a convivência harmônica entre os Estados no Sistema Internacional. Salomón e Guimarães (2021), Milani (2015) argumentam ainda que “Na explicação realista da política internacional, as variáveis internas têm pouco peso em comparação com as variáveis sistêmicas. Nas explicações liberais, pelo contrário, as variáveis internas carregam quase todo o peso da explicação.

A análise em “dois níveis” (internacional e doméstico) tornou-se crucial para entender todas as variáveis que afetam a política externa de um país, Desse modo, abordagens estadocêntricas de análise de política externa se mostraram insuficientes para captar a dinâmica da luta política nacional que envolve partidos, classes sociais e grupos de interesses econômicos e não- econômicos e a sua influência na política externa dos Estados (Schutte; Carneiro; Carneiro, 2019; Silva, 2015).

RELEVÂNCIA DAS RELAÇÕES BILATERAIS NAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS

Com o avanço da globalização, os países são impulsionados a se integrar cada vez mais, estabelecendo maior independência entre eles. As relações bilaterais são consequência desse processo. Para David Baldwin (2016), as relações bilaterais são a soma das relações de poder e influência entre os Estados em busca de seus interesses próprios

As negociações e disputas na esfera internacional oferecem a oportunidade para que aconteça o que podemos chamar de barganha, onde cada país trabalha para satisfazer suas demandas internas sempre avaliando por qual caminho seguir ou o melhor parceiro para seus objetivos. Segundo Putnam (2010, p. 151):

A luta política de várias negociações internacionais pode ser utilmente concebida como um jogo de dois níveis. No nível nacional, os grupos domésticos perseguem seu interesse pressionando o governo a adotar políticas favoráveis a seus interesses e os políticos buscam o poder constituindo coalizões entre esses grupos. No nível internacional, os governos nacionais buscam maximizar suas próprias habilidades de satisfazer as pressões domésticas, enquanto minimizam as conseqüências adversas das evoluções externas.

Como parte da política externa, as relações bilaterais são resultado da soma de fatores internos que geram uma demanda forte o suficiente para alcançar a arena internacional, atores como grupos de pressão, parlamentares, oposição e apoiadores do governo buscam a devida atenção dos tomadores de decisão. Os países, portanto, buscam priorizar seus pilares internos como economia, integração ou desenvolvimento a fim de criar as estratégias que os levem a alcançar seus objetivos, a busca e a manutenção das relações bilaterais é uma das formas de chegar lá.

No Brasil, nota-se uma postura que pode ser definida como universalista, na qual a soma das interações brasileiras em suas relações bilaterais buscou ter uma presença internacional autônoma, não-alinhada de imediato com ideologias externas, sempre diversificando seus parceiros de forma articulada para a manutenção dos interesses internos do país (Lessa, 1988). A busca por uma autonomia diante da influência das grandes potências ganhou força durante o governo de Jânio Quadros (1961), a chamada Política Externa Independente (PEI) trazia consigo a premissa de diminuir a dependência brasileira perante os EUA e criar relações com outros Estados.

O universalismo cria novas perspectivas a qual podemos chamar Parcerias Estratégica, que são, segundo Lessa (1988), relações políticas e econômicas prioritárias reciprocamente remuneradoras, constituídas a partir de um patrimônio de relações bilaterais universalmente configurado.

A relação Brasil-China se solidifica nessa linha de pensamento. Junior e Ribeiro (2013) argumentam que foi no governo Lula (2003-2010) que a relação ganhou um caráter especial, oriunda de uma combinação do crescimento e investimentos entre os dois países. Em vista disso, a partir dos anos 2000 temos uma nova etapa da relação bilateral sino-brasileira mais consolidada e engajada se comparada à anos anteriores, quando sérios problemas econômicos e econômicos inibiram a cooperação entre as partes.

No âmbito das Relações Internacionais, a ampliação das relações bilaterais indica um aumento nas esferas de atuação dos Estados que ao se projetar para fora das suas fronteiras trabalha no fortalecimento de novos campos de atuação de forma estratégica. Vale citar que conceito de estratégia aqui utilizado refere-se as ações para alcançar os interesses do Estado, porém não por meio militar como comumente o termo foi definido por autores como Clausewitz (2010) ou Aron (2002), mas como a articulação dos recursos matérias e intelectuais para a realização de um projeto nacional (Sardenberg, 1995).

Outrossim, as parcerias estratégicas na Relações Internacionais são uma forma possível de atender as demandas internas, que por meio das relações bilaterais aproxima Estados que compartilham de alguns objetivos similares. O Brasil portanto, utilizou da chamada parceria estratégica através do seu tradicional pragmatismo associado ao universalismo seletivo (Lessa,1988).

DO ESTABELECIMENTO DAS RELAÇÕES À DECLARAÇÃO DA PARCERIA ESTRATÉGICA (1974-1993)

Neste tópico será abordado o período inicial das relações diplomáticas entre Brasil e China com a construção das embaixadas em 1974, marcadas por discursos, visitas oficiais de chefes de Estados brasileiros e ministros de Relações Exteriores na perspectiva e abordagem brasileira sobre o distanciamento com os Estados Unidos em 1974 até a visita pelo Visita do Primeiro-Ministro Zhou Rongji ao Brasil e estabelecimento da Parceria Estratégica Brasil-China (maio/junho de 202...).

Sandrim (2011), afirma que a chegada do Presidente Militar Ernesto Geisel em Março de 1974 mudou o rumo da Política Externa brasileira. Em sua primeira reunião ministerial argumentou pela primeira vez sobre o chamado Pragmatismo Ecumênico e Responsável. Assim, o Governo Geisel busca se distanciar dos princípios ideológicos marcados pela Guerra Fria para buscar os próprios interesses nacionais para garantia de melhores condições comercias e modernizações (Fagundes, 2022).

‘Brasil reconhece a China de Mao’, esse é o título divulgado pelo Jornal Folha de São Paulo publicado em 16 de Agosto de 1974. Nessa matéria esclarece o pragmatismo e o estrangulamento das relações Brasil-EUA. Em análise documental a concórdia entre o Brasil e China iniciou em 28/11/1974 com o título: "Acordo entre a República Federativa do Brasil e a República Popular da China sobre a instalação e o funcionamento das Embaixadas do Brasil em Pequim e da China em Brasília", com os signatários Antônio Francisco Azeredo da Silveira, Ministro de Relações Exteriores do governo Geisel e com Kiao Kuan-Hua, Ministro das Relações Exteriores da China (Brasil, 1979).

Em discurso, ao formalizar as relações em nível de embaixada declara Azeredo da Silveira:

[...]Nossos governos têm enfoques distintos para a condução dos seus respectivos destinos nacionais. Ambos consideramos, no entanto, que é um direito inalienável de cada povo o de escolher o seu próprio destino. O que é fundamental, sim, é que nas suas relações internacionais os governos estejam dispostos a, efetivamente, respeitar esse direito. O Brasil e a República Popular da China convergem nesse propósito. Fundamos nosso relacionamento nos princípios de respeito mútuo à soberania e de não intervenção nos assuntos internos do outro país. Estes são os alicerces da nossa amizade (Cabral, 2011, p. 137). 

Diante do discurso do Ministro Azeredo da Silveira em 15 de agosto de 1974 fica, portanto, esclarecido reconhecer a República Popular da China como governo legítimo dando início a um diálogo estratégico que se alonga por 50.

 Conforme Becard ( 2007 ) , a visita do chanceler brasileiro Ramiro Saraiva Guerreiro à RPC em 1982 foi um marco na preparação para a visita histórica do presidente João Figueiredo em 1984. Durante o encontro, Guerreiro dialogou com o ministro das Relações Exteriores chinês, sobre temas de interesse mútuo, e foi recebido por Deng Xiaoping, então vice-presidente do Comitê Central do Partido Comunista Chinês, o que mostrou a relevância atribuída pela China ao estreitamento das relações com o Brasil. 

Para as tratativas de futuros acordos nas relações bilaterais, durante sua visita à Universidade de Xangai, Ramiro Saraiva Guerreiro e o presidente do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq, Dr. Lynaldo Cavalcanti de Albuquerque, avançaram nas negociações de um acordo que se tornaria inédito para a cooperação em ciência e tecnologia entre Brasil e China. Esse acordo, que foi identificado como base para futuros compromissos bilaterais aprimorados em avanços concretos nas áreas nuclear e espacial, especialmente após a visita do presidente Figueiredo à China em 1984. Em resposta às transmissões feitas na ocasião, uma missão chinesa foi enviada ao Brasil no ano seguinte  para identificar produtos a serem comprados, o que incentivava o crescimento e as negociações internacionais em 1985  ( Fagundes , 2022 , p. 103 ) .

Após 10 anos de relações estabelecidas, a visita do presidente João Figueiredo foi um fator determinante para ação diplomática brasileira. Segundo o Embaixador brasileiro Shen Yunao, a visita "significou um grande marco nos anais diplomáticos, pois era a primeira visita de um Presidente brasileiro." ( Conselho Empresarial Brasil China , 2015 , p. 17 ) . Já nas palavras de ( Junior , 2009 , p. 20 )  essa visita foi uma forma "de dar uma demonstração cabal, para a opinião pública externa, que era possível a dois países de sistemas políticos diferentes desenvolverem laços intensos, sem a interferência nos assuntos domésticos respectivos". 

Com o processo de Redemocratização no Brasil a partir de 1985 no governo de José Sarney, abriu-se novas perspectivas para o relacionamento bilateral, conferindo um sentindo universal à política externa. Becard ( 2007 )  afirma que, a transição do regime militar para o civil não afetou as relações bilaterais entre Brasil e China. No entanto, foi uma oportunidade para que ganhasse força por meio de novos canais de comunicação entre esses países. Portanto, com a chegada de José Sarney as relações bilaterais ampliaram-se para novas áreas, com especial foco na cooperação científico e tecnológica, com a iniciação do Programa Satélite Sino-Brasileiro de Recursos Terrestres - CBERS, em julho de 1988 vigorado até os dias de hoje  ( Becard , 2007 , p. 101 ) .

Silva ( 2014 )  lembra que, o primeiro programa espacial se inicia no governo de Jânio Quadros, na décadas de 1960, durante a Guerra Fria a corrida espacial entre os EUA e a União Soviética, que serviu como incentivo ao Brasil começar a iniciar o seu próprio programa espacial. Ainda no seu mandado, criou-se a Comissão Nacional de Atividades Espaciais que é um órgão colegiado criado para formular políticas e coordenar desenvolvimentos no setor espacial brasileiro instituída pela Lei N° 51.133 de 02 de agosto de 1961. Após 20 anos foi criado o Ministério da Ciência e Tecnologia - MCT, abrindo espaço para desenvolver os projetos científicos e tecnológicos próprios. Nesse âmbito se estabelece a cooperação entre Brasil e China que dá origem ao CBRES. 

No ano de 1993, as relações entre Brasil e China se diversificou, incluindo áreas como energias renováveis e informática. Nessa perspectiva, as visitas de Ministros de Estados refletiram na criação de uma maior cooperação que decidiram batizar o vínculo bilateral que define a Parceria Estratégica Brasil-China.

Ao longo da década de 1990, as mudanças nas relações entre Brasil e China prepararam o terreno para uma cooperação mais profunda em áreas econômicas e temas de política internacional nas décadas seguintes. Com a chegada do século XXI, a parceria se intensificou, impulsionada pela crescente influência de ambos os países no cenário global.

 a atuação da política externa brasileira entre 2003-2023

Durante seu governo, iniciado em 2003, o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva elevou as relações com a China a um novo nível. Ele realizou uma viagem oficial à República Popular da China, que resultou em 9 acordos bilaterais e 14 contratos comerciais. Além disso, durante a visita do Presidente Hu Jintao ao Brasil, Lula concedeu à China o status de economia de mercado em novembro de 2004. No contexto da Comissão de Direitos Humanos da ONU, o Brasil também votou a favor da "non-action motion" , que retirou uma resolução que pedia a visita de relatores à China para investigar a situação dos direitos humanos. 

Ainda no ano de 2004, Lula estava reformulando a política externa brasileira para países em desenvolvimento tendo como objetivo instalar-se como potência regional fazendo com que as parcerias começassem a ter destaque nas relações internacionais  ( Becard , 2007 ) . Nessa perspectiva o Brasil, foi com um principal objetivo que era sinalizar a importância de os chineses se sentirem confiantes para novos acordos comerciais.

Brasil e China criam a Comissão Sino-Brasileira de Alto Nível de Concertação e Cooperação - Cosban. O objetivo dessa comissão é incentivar o relacionamento bilateral, promovendo o diálogo aberto sobre temas que convergem aos interesses dos dois países, as sessões plenárias ocorrem a cada dois anos e a 1ª Reunião aconteceu em 24 de março de 2006 em Beijing com a particificação do Vice Presidente José Alencar e da Vice-Primeira-Ministra Wu Yi.

Conforme cita Silva ( 2014 ) , a iniciativa da Cosban resultou no lançamento do CBRES-2B em 2007, a partir do centro de lançamento de Taiyuan na China.

Um dos marcos mais importantes realizados pelo governo brasileiro foi a segunda visita de Estado do presidente Lula a capital Beijing, em 2008. O objetivo da viagem era fechar acordos comerciais para que elevassem para US$ 30 bilhões as importações e exportações até  2010  ( Becard , 2007 ) .  Além disso, em meio a comemoração dos 35 anos das relações bilaterais em 2009, apesar da queda no valor total comercializado, a China superou os Estados Unidos, tornando-se o maior parceiro comercial do Brasil. Essa posição de liderança se mantém até os anos presentes.

Durante os governos Dilma Rousseff (2011-2016), uma parceria estratégica entre Brasil e China se expandiu, especialmente na área econômica e comercial. Dilma reforçou a importância da China como principal parceira comercial do Brasil, consolidando uma relação baseada na exportação de commodities brasileiras, como soja e minério de ferro, e na importação de produtos fabricados chineses. Um dos pontos altos dessa parceria foi a criação do Fundo Brasil-China de Cooperação para Expansão da Capacidade Produtiva, lançado em 2015, com um transporte inicial de US$ 20 bilhões, financiado para financiar projetos de infraestrutura no Brasil ( Conselho Empresarial Brasil China , 2015 ) .

No entanto, essa relação também evidencia desafios importantes, como a dependência brasileira da exportação de produtos primários e o impacto disso na sua balança comercial. Apesar disso, a China manifestou interesse em diversificar os investimentos no Brasil, ampliando a atuação em setores como energia renovável e tecnologia.

Com a chegada do governo Michel Temer (2016-2018), houve uma tentativa de manter a política externa pragmática, dando continuidade às relações com a China. O foco foi na atração de investimentos para infraestrutura e no fortalecimento do comércio bilateral. Durante esse período, os dois países reforçaram sua participação no BRICS, ampliando a cooperação em temas multilaterais, como desenvolvimento sustentável e reforma de instituições financeiras internacionais.

A partir de 2019, sob o governo de Jair Bolsonaro, a política externa brasileira apresentou mudanças significativas. Inicialmente, houve declarações que geraram contribuições diplomáticas com a China, principal parceira comercial do Brasil  ( Cortez Oliveira , 2024 ) . No entanto, a importância económica dessa relação levou a ajustes na postura do governo, com esforços para manter a cooperação em áreas estratégicas. Durante a pandemia de COVID-19, a China desempenhou um papel crucial no fornecimento de insumos médicos e vacinas, o que reforçou a interdependência entre os dois países.

Em 2023, com o retorno de Luiz Inácio Lula da Silva à presidência, houve uma reaproximação significativa com a China. Lula realizou sua quarta visita de Estado ao país, firmando 15 novos acordos bilaterais em áreas como ciência, tecnologia, infraestrutura e finanças. O foco voltou-se para a revitalização da parceria estratégica, com a inclusão de novas áreas de cooperação, como transição energética e sustentabilidade.

Esse período de duas décadas demonstra como a política externa brasileira se adaptou às mudanças internas e ao cenário global, reafirmando a relevância da China como um dos principais parceiros estratégicos do Brasil. A construção dessa relação exemplifica o equilíbrio entre pragmatismo e soberania nas decisões diplomáticas do Brasil.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As relações entre Brasil e China, ao longo de cinco décadas, passaram por uma evolução significativa, transformando-se de uma aproximação inicial pragmática para uma parceria estratégica abrangente. Esse período é marcado por mudanças estruturais na política externa de ambos os países, que buscaram aproveitar as oportunidades geradas pelo crescimento econômico e pela globalização. Dessa forma, as interações Brasil-China se consolidaram como um exemplo de diplomacia bem-sucedida entre países em desenvolvimento, baseando-se na cooperação mútua e no respeito às especificidades de cada nação.

A análise da política externa brasileira ao longo deste estudo revelou que o sucesso dessa relação dependeu, em grande medida, de uma abordagem equilibrada e de objetivos compartilhados. A China, ao se tornar o principal parceiro comercial do Brasil, superando os Estados Unidos, estabeleceu uma base sólida para um intercâmbio econômico vantajoso. Este cenário foi essencial para o desenvolvimento de acordos bilaterais que abrangem áreas estratégicas, como ciência e tecnologia, comércio, infraestrutura e sustentabilidade ambiental.

Desde a criação do Programa CBERS e de outros projetos, a parceria em tecnologia e ciência tornou-se uma prioridade para as duas nações, ampliando o campo de atuação conjunta. A troca de conhecimento científico e o desenvolvimento de tecnologias espaciais reforçaram o vínculo bilateral e abriram portas para novas colaborações no âmbito da inovação. Esse eixo de cooperação contribui não só para os interesses dos países envolvidos, mas também para o avanço tecnológico global.

Por outro lado, a parceria entre Brasil e China enfrenta desafios significativos, especialmente devido à complexidade das suas políticas internas e ao cenário internacional em constante mudança. A rápida ascensão econômica chinesa e o desejo brasileiro de consolidar uma política externa autônoma demandam uma negociação contínua. Isso se deve à necessidade de alinhar os interesses nacionais sem comprometer a independência diplomática e a capacidade de cooperação estratégica.

Além disso, o contexto de poder e influência global faz com que Brasil e China precisem adaptar suas agendas em consonância com suas demandas domésticas e internacionais. A análise dos acordos e iniciativas deste estudo demonstra que, apesar de interesses comuns, diferenças culturais, políticas e econômicas requerem um diálogo constante e uma revisão dos termos de cooperação para atender às expectativas de ambas as nações.

Nesse sentido, os próximos anos serão cruciais para o futuro das relações Brasil-China, especialmente considerando a ampliação de suas interações em fóruns multilaterais e organizações internacionais. A atuação conjunta nos BRICS e na ONU são exemplos dessa convergência que fortalece o papel de ambos como atores globais. A partir desse alinhamento, Brasil e China podem explorar ainda mais as oportunidades de cooperação, consolidando-se como modelos de parceria para outros países em desenvolvimento.

Portanto, as relações sino-brasileiras representam um caso de pragmatismo diplomático que equilibra ganhos econômicos e o respeito à soberania nacional. Para que essa parceria permaneça robusta, é essencial que ambos os países mantenham uma postura de diálogo aberto e adaptação às novas realidades. Esse estudo, portanto, contribui para o entendimento da importância dessas relações e sugere a continuidade de políticas que assegurem a cooperação e o progresso conjunto.

Referências

Aron Raymond Paz e guerra entre as nações . Brasília : UnB , 2002 .

Baldwin David A. Power and International Relations A Conceptual Approach . Princeton University Press , v. 1 , f.  119 , 2016 237 p .

Becard Danielly Silva Ramos O Brasil e a República Popular da China política externa comparada e relações bilaterais (1974-2004) , f.  168 . 2007 336 p .

BRASIL Camâra dos Deputados Decreto n.  51.133 de 02 de agosto de 1961 Diário Oficial da União , Brasília .

brasil China Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada . Brasília , 2023 . Disponível em: https://www.ipea.gov.br/china . Acesso em: 15 out. 2024 .

Brasil Ministério das Relações Exteriores Decreto n.  83.282 de 12 de março de 1979 Diário Oficial da União , BRASÍLIA 13 de março de 1979 .

Cabral Severino Brasil e China no Reordenamento das Relações Internacionais Desafios e Oportunidades . Brasília : Fundação Alexandre de Gusmão , 2011 536 p . Disponível em: https://funag.gov.br/loja/download/905-Brasil_e_China_no_Reordenamento_das_Relacoes_Internacionais.pdf . Acesso em: 8 out. 2024 .

Clausewitz Carl von Da guerra . WWF Martins Fontes , v. 3 , f.  519 , 2017 1038 p .

Conselho empresarial brasil china 40 anos de relações diplomáticas entre Brasil e China . Especial ed . Rio de Janeiro , 2015 .

Cortez Arthur Rodrigues ; Oliveira Octávio Henrique Alves Costa de 50 Anos das Relações Brasil-China Uma Jornada de Cooperação e Desenvolvimento . Revista Terra Cota , Brasília , v. 2 , n. 1 , maio 2024 .

FAGUNDES VISENTINI A Política Externa do Regime Militar da Ideologia ao Pragmatismo Revista de História . 2022 p. 38-63 . Disponível em: https://periodicos.ufjf.br/index.php/locus/article/view/36329 . Acesso em: 1 out. 2024 .

Ferreira Marcos Alan S. V. Análise de Política Externa em Perspectiva atores, instituições e novos temas . Paraíba : Editora UFPB , f.  178 , 2020 185 p . Disponível em: https://www.editora.ufpb.br/sistema/press5/index.php/UFPB/catalog/view/647/770/6365 . Acesso em: 25 set. 2024 .

Gonçalves Fernanda Nanci ; Pinheiro Letícia Análise de política externa o que estudar e por quê? . 1 ed . Curitiba : Editora Intersaberes , 2020 .

Jr Joseph S Nye Soft Power The Means To Success In World Politics . Hachette UK , v. 2 , f.  104 , 2009 208 p .

Junior Oswaldo Biato A parceria estratégica sino-brasileira origens, evolução e perspectivas (1993-2006) . Instituto Rio Branco , f.  223 , 2009 446 p .

JúNIOR Haroldo Ramanzini ; Ribeiro Pedro Feliu As relações bilaterais Brasil-China: uma relação em processo de afirmação . Carta Internacional , v. 8 , n. 1 172 p , 2013 .

Kant Immanuel À paz perpétua Um projeto filosófico . Editora Vozes , v. 3 , f.  50 , 2024 100 p .

Keohane Robert O. After Hegemony Cooperation and Discord in the World Political Economy . Princeton University Press , v. 3 , f.  154 , 2005 307 p .

LESSA Antônio Carlos A diplomacia universalista do Brasil: a construção do sistema contemporâneo de relações bilaterais . Revista brasileira de política internacional , v. 41 2 p , 1998 .

Milani Leticia Pinheiro e Carlos R. S. Política externa brasileira: as práticas da política e a política das práticas as práticas da política e a política das práticas . Editora FGV , v. 3 , f.  204 , 2015 408 p .

PUTNAM Robert D Diplomacia e política doméstica a lógica dos jogos de dois níveis . Revista de Sociologia e política , v. 18 p. 147-174 , 2010 .

Salomón Mónica ; Guimarães Feliciano de Sá O que a análise de política externa já nos disse e ainda tem a nos dizer sobre o Brasil? Uma agenda de pesquisa com teorias médias . Santo André : Editora UFABC , 2021 p. 417-468 . Disponível em: https://books.scielo.org/id/d3r7w/pdf/batista-9786589992295-13.pdf . Acesso em: 25 set. 2024 .

Sandrim Julião A atuação multilateral do Brasil sob o governo de Ernesto Geisel as dinâmicas do Pragmatismo Ecumênico e Responsável (1974-1979) História Social, [S. l.], v. 14, n. 18, p. 199–218, 2011. DOI: 10.53000/hs.v14i18.358 . Disponível em: https://ojs.ifch.unicamp.br/index.php/rhs/article/view/358 . Acesso em: 23 set. 2024 .

Schutte Giorgio Romano ; Carneiro Bruno Castro Dias ; carneiro Gabriel Santos Jogo de dois níveis voltado ao eleitorado uma análise da política externa bolsonarista . Revista Conjuntura Global , v. 8 , n. 2 98 p , 2019 .

Silva Danielle Costa da Política Externa é Política Pública reflexões sobre a política externa brasileira Dossiê: REGIONALISMOS – SIMPORI 2014 . Rio de Janeiro , 2015 11 p . Disponível em: https://www.labmundo.org/wp-content/uploads/2021/05/Artigo-2015-Danielle-Costa-da-Silva-Revista-Neiba.pdf.pdf0 . Acesso em: 19 nov. 2024 .

Silva Paulo Henrique da Brasil-China e a parceria estratégica em ciência e tecnologia o Programa CBERS e as novas oportunidades de cooperação . João Pessoa , 2014   Dissertação   (Relações Internacionais) Universidade Estadual da Paraíba João Pessoa 2014 .

Conteúdos semelhantes

Centro Universitário Ítalo Brasileiro- Uniítalo- História

no iconno icon

FLORISVALDO HENRIQUE DA PURIFICACAO

Gnv no Brasil: História, Evolução e Análise do Mercado Contemporâneo

no icon

FELIPE FERNANDES SILVA

Preenchimento Labial na Harmonização Facial

no icon

JULIANA TEIXEIRA PORFIRIO